O primeiro ponto que precisamos estabelecer aqui é: O Novo Testamento é a continuação da história que termina em Crônicas e Malaquias — e Macabeus, se o consideramos como fonte histórica. Logo, não podemos começar a ler o novo testamento como se fosse uma outra história, zerada, sem antecedentes. O Novo Testamento é parte da história que temos visto até aqui. É praticamente impossível ler e entender o Novo Testamento sem um mínimo de entendimento prévio do pano de fundo do Antigo Testamento. Não há como entender bem as histórias narradas no Novo Testamento sem entender a importância dos conceitos de Aliança, Jardim, Templo, Lei, Reino de Deus, Salvação, Messias, Terra e Céu. Assim, quando você virar a página de Malaquias e se deparar com o Evangelho de Mateus, entenda isto: Mateus (ou Levi), era um judeu, um coletor de impostos que se vendeu para trabalhar pelos inimigos, os romanos, e que, em certo tempo, passou a ser seguidor de um Professor judaico chamado Jesus que, conforme ele acreditava, seira o verdadeiro Messias, o Rei Ungido de Israel prometido pelos profetas para libertar Israel da opressão inimiga. Muitos anos após a história acontecer esse Mateus decide que é importante registrar essa história em um livro, para que Israel soubesse que a História de Deus e seu povo ainda estava em andamento. Coisas novas e surpreendentes estavam acontecendo. Deus não cortou a raiz! Há algo nascendo no meio de toda a bagunça! Observem bem.

De forma geral isso tudo vale para Marcos, Lucas e João também, mas com variações[1]. Assim, esses autores escrevem a História desse personagem (Jesus) e chamam essa história de Evangelho. A palavra Evangelho, do grego euangelion significa, literalmente, Boas Novas, Boas Notícias. Muitos estudiosos apontam que em todo império romano, quando nascia um filho do imperador romano, essa notícia era proclamada em todas as províncias e chamada de “Boa Nova, nasceu o próximo César”. Os teólogos apontam para o fato de que os quatro evangelistas usam esse termo evangelho para dizer que, Jesus, seria o filho do imperador maior, isto é, o SENHOR, Yahweh, o Rei do Universo. Mas eu — concordando com outros teólogos — também penso que os evangelistas liam muito o antigo testamento e estavam acostumados com o conceito de “Boa notícia” do hebraico, sobretudo em Isaías 52:7 que diz “Que formosos são sobre os montes os pés do que anuncia as boas-novas, que faz ouvir a paz, que anuncia coisas boas, que faz ouvir a salvação, que diz a Sião: O teu Deus reina!”. Isso é o evangelho, a boa notícia de que o Reino de Deus é chegado, de que a paz (Shalom), o Descanso (Shabat), que a Salvação e o Reino de Deus estão chegando! Anunciar o evangelho é anunciar que Deus Reina e Deus Salva. Não é por coincidência então, que o nome do personagem principal dessa história, Jesus, signifique, em hebraico, Deus Salva[2].

Os evangelhos apontam que esse Jesus é Deus. Ele é a Salvação de Deus em pessoa. Ele é o Reino de Deus, logo, Ele é Rei. Ele é o Filho Escolhido de Deus, o Ungido, logo, ele é o Messias. Assim, toda a história dos Evangelhos busca apresentar Jesus não como um personagem construído do nada, mas sim como um personagem que vai cumprir e consumar tudo o que Deus tem feito desde o Jardim até o presente tempo e além, consumando os tempos finais. Jesus então, pode até ser um “novo personagem”, mas, ao mesmo tempo, é o personagem que Israel espera desde que o Reino de Israel caiu (e até antes).

Uma vez que Mateus, Marcos, Lucas e João tem essa missão de comunicar a Israel e a todos os leitores não judeus que esse Jesus é o Rei de Israel, a Salvação de Deus e o Messias que irá completar os planos de Deus que estão em andamento (cheio de altos e baixos) desde o Jardim do Éden, eles — os evangelistas — precisam convencer o povo disso. Eles precisam apresentar bons argumentos para isso. Lembrem-se que já houveram outros messias (falsos). Lembrem que a religião judaica estava se acomodando e aceitando viver debaixo do governo romano. Lembrem que a última grande revolta, a dos Macabeus, no fim, fracassou e que todos estavam meio desconfiados sobre como seria a vinda da Salvação de Deus e do Messias. Os evangelistas precisam apresentar as “credenciais” de Jesus. Os evangelhos também tentam fazer isso.

Para fazer isso Lucas e Mateus entendem que é necessário começar argumentando sobre a “legitimidade” do Reinado/Messiado de Jesus. Ou seja, eles querem provar que Jesus tem o sangue real que lhe dá direito ao trono, afinal, Deus prometeu em diversas partes do Antigo Testamento que o Messias seria da dinastia e família de Davi. Esses dois evangelistas narram a Genealogia de Cristo (Mt 1 e Lc 3), demonstrando que ele é um legítimo descendente de Abraão, e da Tribo de Judá e da Família Real (de Davi). Como todos sabem, Jesus nasceu por meio de uma virgem da tribo de Judá, Maria, mas foi concebido por meio da ação sobrenatural do Espírito Santo dentro da jovem Maria. Ou Seja, ele não tem pai biológico. Mas Maria tinha um esposo (ou noivo), José, e ele sim, além de também ser da tribo de Judá, era ancestral direto da família de Davi. Então, Deus, por meio do Espírito Santo, colocou um filho seu na família de Davi. Ponto para Jesus.

Os evangelistas também apontam que a obra milagrosa de Maria engravidar virgem é sinal do agir de Deus, com base na profecia de Isaías (7:13). O nascimento do menino Jesus em Belém também é registrado como ponto a favor de Jesus, por causa da profecia de Miqueias (5:2–4). Da mesma forma, seu nascimento em uma manjedoura e o anúncio glorioso de seu nascimento, visto por pastores nos campos e por magos que vieram do oriente para louvar a esse menino Rei dos Judeus. Tudo aponta para a glória do Rei que nasceu. Mas logo Herodes ficou sabendo disso e, claro, não gostou nada. Herodes tentou matar Jesus e, para isso, promoveu um massacre de crianças, o que os evangelistas também entendem ser um cumprimento profético (Jr 31:15). Jesus e sua família fogem para o Egito e, novamente, profético (Os 11:1). Triste, mas são mais alguns pontos para Jesus.

Mateus e Lucas então pulam a história de Jesus da adolescência para o início de seu ministério público como professor, lá pelos seus 30 anos de idade. É nesse ponto que Marcos e João iniciam sua narrativa. Ao iniciar seu ministério Jesus cumpre mais profecias. Antes do Rei chegar, sempre chegam seus funcionários aprontando a estrada e avisando a todos da chegada do rei em breve. É aqui que somos apresentados a João, o Batista. João era primo de Jesus, também fruto de um nascimento milagroso, alguém separado para Deus. Era um esquisitão que vivia longe da sociedade, no deserto, vestido de roupas esquisitas e comendo comidas esquisitas. Ele era assim distinto, santo, separado, porque já nasceu sabendo sua missão. A missão de João era profética, foi prometido por Isaias (Is 40) e Malaquias (Ml 4). Ele (João) é a voz que clama do deserto. O que ele clama? Ele clama “preparem o caminho para o Rei, se arrependam, o Rei está chegando, ouçam o evangelho, ou seja, as boas notícias”. João era o arauto, o funcionário do rei tocando trombeta para a chegada do Rei, do Messias, do Reino de Deus prometido há muitos séculos.

Em um belo dia em meio ao Rio Jordão Jesus aparece no meio da multidão de pessoas que vinham para ser batizadas por João. O curioso é que Jesus também vem para ser batizado. João não entende e se nega a fazer o batismo do seu primo, afinal, como ele mesmo disse, Jesus é “o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”. João está associando Jesus à figura do cordeiro, o animal sacrificado que leva os pecados de Israel e purificando o povo. Há nessa fala de João referências ao Êxodo e à Páscoa, mas também a Isaías 53. João está explodindo de alegria e ansiedade! Ele quer ver seu primo em ação salvando a Israel, trazendo o Reino de Deus! Mas Jesus sabe que tudo tem o tempo certo para acontecer. Jesus convence João e é por ele batizado.

O que João não sabia é que aquele não era um batismo “normal”. Batismos funcionavam como uma espécie de ritual de purificação. No entanto, Jesus surge como esse cordeiro que faz a purificação dos pecados e o Antigo Testamento diz que o Cordeiro a ser sacrifício teria sempre que ser perfeito, sem defeitos. Logo, Jesus, o Cordeiro de Deus, é Santíssimo, sem pecados e que, portanto, não tinha nada sujo para purificar. Descobrimos a seguir que o Batismo de Jesus é, na verdade, um ritual de Unção e Consagração. Assim como Reis, Profetas e Sacerdotes eram ungidos e consagrados, Jesus também está sendo agora, não no Templo, com óleo sagrado, onde estão os poderosos Fariseus, mas nas águas barrentas do Rio Jordão por um esquisitão, o João. Como podemos saber que esse batismo não é de purificação, mas de unção? Porque logo após sair das águas, o céu se abre sobre Jesus, o Espírito de Yahweh desce em um formato como uma pomba. Certamente um judeu que estudou o Antigo Testamento lendo essa história lembraria da passagem de Isaias 61 que diz:

“O Espírito do SENHOR Deus está sobre mim, porque o SENHOR me ungiu para pregar boas-novas aos quebrantados, enviou-me a curar os quebrantados de coração, a proclamar libertação aos cativos e a pôr em liberdade os algemados; a apregoar o ano aceitável do SENHOR e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar todos os que choram e a pôr sobre os que em Sião estão de luto uma coroa em vez de cinzas, óleo de alegria, em vez de pranto, veste de louvor, em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem carvalhos de justiça, plantados pelo SENHOR para a sua glória” (Is 61:1–3).

O Espírito de Yahweh desce sobre Jesus ungindo-o para anunciar as Boas Notícias, da chegada do Reino de Deus e reverter o quadro bagunçado de tristeza para alegria. No fim, Israel, esse tronco cortado iria florescer de novo e se tornar conhecido como um Carvalho de Justiça, uma forte árvore. Há esperança após a opressão dos Romanos.

Mas não é “só isso” que acontece após o batismo/unção de Jesus. Após isso Yahweh, Deus, fala lá de cima: “Este é o meu filho amado! Nele minha alma tem grande alegria”. Isso, por sua vez está cumprindo a profecia do Salmo 2:7 em que Deus fala a um Rei da linhagem de Davi “Proclamarei o decreto do Senhor: Ele me disse: Tu és meu Filho, eu, hoje, te gerei”. Jesus, o Ungido (Messias) é alguém que brotou e foi enviado de dentro do coração de Deus e veio ao mundo como uma semente. O Filho de Deus é um homem, um rei ungido! Mais alguns importantes pontos em favor de Jesus.

A seguir, Jesus passa por uma experiência que todo servo de Deus verdadeiro precisa passar, a provação. Jesus é levado pelo Espírito de Deus ao deserto para ser tentado pelo Diabo. Ele resiste à fome de 40 dias, simbolizando os 40 anos do povo de Israel no deserto. Contrariando todas as sugestões do Diabo Ele resiste em usar seu poder por interesse próprio: ele não transforma pedras em pães, ele não se torna um ditador sobre as nações, ele não abusa do cuidado divino. Jesus sabe da profecia de que os anjos de Deus estão o guardando (Sl 91:11), mas resiste. Jesus tem sucesso em tudo que Israel falhou. Ele é um perfeito Israelita. Jesus vence a tentação, ele está pronto, de fato, para iniciar a obra que veio para fazer.

Ele inicia seu ministério na região da Galileia, uma terra ao norte de Israel, na verdade, quase fora de Israel, passando de Samaria. Jesus, o Rei de Israel, começa seu ministério não na Judeia, perto do templo e de Jerusalém, em meio à elite. Jesus inicia seu ministério em uma terra complicada, cheia de influência pagã e misturas. Caná, Nazaré, Cafarnaum, Magdala, Betsaida, Gadara. São lugares que um Fariseu de Jerusalém jamais gostaria de pisar. E é exatamente lá que Jesus estava. E isso também é profético. Estava escrito no Livro do Profeta Isaías:

“Mas para a terra que estava aflita não continuará a obscuridade. Deus, nos primeiros tempos, tornou desprezível a terra de Zebulom e a terra de Naftali; mas, nos últimos, tornará glorioso o caminho do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios. O povo que andava em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região da sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz”. (Is 9:1–2).

Jesus é essa luz que brilhou em um lugar de trevas. Esses são, portanto, os “últimos tempos”. O fim começou. É nessa região que Jesus chama seus discípulos e cada um deles carregava em si alguma coisa que para um fariseu faria Jesus ser um personagem ainda mais esquisito. Jesus se torna amigo de uma Mulher endemoninhada, Maria Madalena. Jesus Jesus chama ex-discípulos de João, como Filipe e André, que eram considerados esquisitos como seu mestre. Jesus chama para ser seu discípulo um cobrador de Impostos, Levi, ou, Mateus, um homem de quem todo o povo de Israel tinha nojo por seu trabalho ser considerado uma traição. Jesus chama pescadores pobres (Pedro, irmão de André, Tiago, João, filhos de Zebedeu). Jesus chama um terrorista radical para seu grupo, Simão, o Zelote. Jesus chama pessoas com a fé abalada — como Tomé e talvez Natanael — e de fé frágil como Judas Iscariotes. E outros homens como Tadeu, Bartolomeu. Enfim, Jesus tinha amigos improváveis e esquisitos.

Era impensável esse povo todo sentado em uma mesma mesa. O Zelote não demoraria um minuto para degolar o Cobrador de Impostos. E pior, talvez eles nem se sentassem à mesa se Maria Madalena estivesse lá, afinal, ela era uma mulher impura. Mas foi exatamente isso que Jesus veio trazer: o Shalom de Deus, a Paz. A Paz de Deus não finge que não existem conflitos. Deus mexe com os conflitos para resolve-los. Deus quer reunificar a nação de Israel e começa na Galileia com Galileus e outros sujeitos considerados inferiores. Pode vir alguma coisa boa da galileia? Fica a pergunta.

Se a mesa íntima de Jesus já era essa coisa louca, imagine as outras pessoas ao redor dele! Jesus andava com judeus desprezíveis pela Elite Judaica, como os publicanos (o famoso baixinho Zaqueu), com “pecadores” tipo leprosos, aleijados, cegos e outros deficientes. Jesus faz coisas impensáveis para um judeu daquele tempo: ele toca cadáveres (para os ressuscitar, como fez com a filha de Jairo), toca leprosos e uma mulher com hemorragia (para os curar). Jesus também anda com pessoas de classe inferior, como mulheres samaritanas imorais e divorciadas e até mesmo com gentios, oficiais romanos, o pior tipo de todos (para israelitas). É muita coisa bizarra. Nada disso era esperado de um judeu correto, muito menos do Messias, embora tudo isso fosse profético.

Conforme o ministério de Jesus cresce os religiosos (fariseus, saduceus) começam critica-lo. Se eles não foram capazes de identificar Jesus como o Messias por seu nascimento que cumpriu perfeitamente as profecias exigidas (da linhagem real, virginal, em Belém, visitado por magos orientais e etc), não seria agora que eles o identificariam. Apesar de tudo ser profético, há muita coisa que os fariseus, mestres da lei, escribas não entendem. Eles aprenderam a ler Isaías e os demais profetas (Daniel, sobretudo) tornando a discussão messiância secundária, afinal, era uma pauta perigosa com os romanos ali na cola deles. A elite religiosa de Israel conhecia os textos de cor e salteado, mas não conseguia entende-los. Em conversa com alguns dos membros dessa elite Jesus disse: “Vocês estudam minuciosamente as Escrituras porque creem que elas lhes dão vida eterna. Mas as Escrituras apontam para mim! E, no entanto, vocês se recusam a vir a mim para receber essa vida. Sua aprovação não vale nada para mim, pois eu sei que o amor a Deus não está em vocês” (Jo 5:39–42). Os intérpretes da Lei falharam em sua missão de interpretar a Lei que apontava o tempo todo para as promessas de Deus. Eles esqueceram o tema central do antigo testamento: Deus tem um plano, ou seja, estabelecer seu reino e sua glória em toda a terra, trazendo seu reino, seu jardim, por meio do seu Ungido. Agora, o Ungido estava diante deles e eles não puderam crer nisso.

Jesus veio para os seus (Israel), mas eles não o receberam. Jesus quis proteger seu povo como a galinha protege os pintinhos debaixo das asas, mas eles não quiseram. Jesus trouxe o Reino de Deus, mas as elites não puderam perceber isso, ao passo que os pequeninos (samaritanos e judeus de segunda classe) estavam percebendo e aceitando as Boas Notícias do Reino de Deus. O Reino de Deus veio, mas Israel não o identificou, e isso porque estavam esperando algo diferente. Após tantas experiências frustrantes de dominação política e militar (Egípcios, Assírios, Babilônios, Persas, Gregos e Romanos) Israel estava paralisado no meio disso tudo. Então, eles só esperavam pelo Messias como um líder político que viria para detonar com os Romanos em uma Batalha Final no fim dos tempos. Veja, eu não estou dizendo que o Messias (Jesus) não seja um rei e líder do seu povo em uma guerra. Ele é sim, o Antigo Testamento diz isso e, por isso mesmo, Herodes quis mata-lo ainda bebê. Também por isso a Elite Judaica e os Romanos o levaram para Cruz. Jesus é uma ameaça política a todos que não reconhecem que ele é o Rei de Israel e o Rei do Universo e isso até hoje!

Contudo, ao olhar apenas para a encrenca política Israel deixou de olhar para sua real encrenca: a infidelidade e a falta de confiança em Deus. Lembrem-se do que eu venho dizendo aqui. Quem cumpre a aliança sozinho é Deus. Ele fez o pacto enquanto Abraão dormia. Ele trouxe o cordeiro que substituiu Isaque. Ele libertou o povo do Egito e abriu o mar sozinho. A parte do povo é apenas confiar na fidelidade de Deus. A parte do povo é ter fé. Mas Israel não percebia que precisava disso. Israel não percebia que seu problema maior era a falta de fé e a infidelidade, ou seja, o pecado. Assim, enquanto esperavam apenas um general para derrotar os Romanos, Yahweh mandou exatamente o que eles precisavam: Um agricultor para restaurar o jardim e o toco da árvore que havia sido cortada. Deus mandou alguém para cultivar a fé do povo. Deus não mandou o Messias para os romanos. Deus mandou o Messias para restaurar a fé de Israel. Sim, ele tem um plano para os romanos, para os impérios malignos e para todos os povos estrangeiros, mas antes, ele tem um plano antigo para Israel que precisa se cumprir. O messias veio, mas antes de usar sua espada ele arregaçou as mangas e pegou no arado e na enxada. Havia muito trabalho a ser feito. O problema de Israel estava mais fundo, era preciso cavar o solo, cultivar, refazer todo o trabalho desfeito e bagunçado após tantas guerras e problemas.

Essa imagem de espadas sendo abandonadas e enxadas sendo empunhadas não é algo que eu estou inventando aqui. Isaías profetizou isso quando disse “O SENHOR será mediador entre os povos e resolverá os conflitos das nações. Os povos transformarão suas espadas em arados e suas lanças em podadeiras. As nações deixarão de lutar entre si e já não treinarão para a guerra” (Is 2:4). Logo, o Messias que vem para reestabelecer Israel como o povo que cultiva e cuida da terra como o jardim de Deus, vem também para que Israel seja o agente da paz de Deus no mundo. O objetivo do Messias não é se tornar um grande líder militar que vai destruir as nações estrangeiras, eliminando-as, como Israel queria, por meio da violência. O objetivo do Messias não é proteger a cidade de Jerusalém contra os romanos pagãos. O objetivo do Messias é escancarar as portas do Jardim de Deus novamente e permitir que a glória de Deus invada toda a terra. O objetivo do Messias Jesus é fazer com que o Jardim pessoal de Deus, Israel, se espalhe e frutifique por toda a terra de forma que todas as nações larguem suas espadas e lanças e peguem os arados e as podadeiras. Deus não quer destruir os romanos, Deus quer que eles se convertam dos maus caminhos e reconheçam Yahweh como o único Deus verdadeiro e voltem à comunhão com Ele. Deus (Yahweh) mesmo é o mediador dos conflitos entre a humanidade. O Reino de Deus é descrito inclusive como um reino onde a própria criação vive de forma pacífica. Isaías profetizou que

Naquele dia, o lobo viverá com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito. O bezerro estará seguro perto do leão, e uma criança os guiará. A vaca pastará perto do urso, e seus filhotes descansarão juntos; o leão comerá capim, como a vaca. O bebê brincará em segurança perto da toca da cobra; sim, a criancinha colocará a mão num ninho de víboras. Em todo o meu santo monte, não se fará mal nem haverá destruição, pois, como as águas enchem o mar, a terra estará cheia de gente que conhece o SENHOR. Naquele dia, o descendente de Jessé será uma bandeira de salvação para todo o mundo. As nações se reunirão junto a ele, e a terra onde ele habita será um lugar glorioso” (Is 11:6–10).

De forma ainda mais enfática, Isaías disse:

“O lobo e o cordeiro comerão juntos, o leão se alimentará de palha como o boi, mas as serpentes comerão pó. Em meu santo monte, ninguém será ferido nem destruído; eu, o Senhor falei!” (Is 65:25).

Além dos conflitos da humanidade, Deus irá restaurar a perfeição do Jardim em que não existe morte ou destruição. Animais como o Lobo e o Cordeiro deixarão de ser presa e predador. Se tornarão amigos. O objetivo de Deus é que toda a humanidade seja o seu povo, e toda a criação viva em paz como era no jardim. A única bandeira que existirá será a bandeira do Messias, o descendente de Jessé, Jesus. A história de Israel está dentro dos propósitos maiores de Deus de espalhar sua paz (Shalom) e dar seu descanso (Shabat) a todo a terra. Israel é apenas o escolhido para fazer essa missão dar certo. O Messias é o escolhido, o braço de Deus para conduzir Israel nessa missão.

Infelizmente Israel não foi capaz reconhecer que Deus estava, novamente, agindo em seu meio e consertando as coisas. Entretanto, o que estava por vir era ainda mais chocante. A forma como Deus iria iniciar a concretização do seu plano é algo completamente impensável para a mentalidade judaica daquele tempo. Embora estivesse tudo escrito e profetizado, absolutamente ninguém na terra estava pronto para o que viria a seguir.

— — — — — — — — — — —

[1] João também foi discípulo de João, mas Marcos e Lucas não. Eles coletaram registros de outras fontes, talvez fontes orais e escreveram essa história (o evangelho) talvez voltados para o público gentio (estrangeiros) e judeus fora de Israel.

[2]Jesus ou Yeshuah é a combinação de suas palavras Ye’, que seria uma abreviação do nome de Deus (Yahweh) e Shuach (salvação). Jesus é uma variação, por exemplo, de Josué (Yehoshua), que tem o mesmo significado (Yahweh Salva).

--

--

Diego Montenegro

Esposo. Cristão Reformado. Mestre em Geografia e professor. Tentado a mostrar isso em palavras {1 Pedro 3:15}